quinta-feira, 12 de maio de 2022

Baudelaire: a serpente que dança

 

Babo de ver, gata indolente,
Do teu corpo de modelo,

Como uma lingerie insolente,

Tremeluzir o pelo.

Sobre teu cabelo profundo,

Acres perfumes,

Mar odorante e vagabundo,
Ondas azuis e negrumes,

Como um navio que se espelha

No vento do novo dia,

Minha alma sonhadora aparelha
Para um céu de utopia.
(como um navio que desperta

Com o vento da manhã;

Minha alma sonhadora deserta

Rumo a uma terra pagã.)

 

Teus olhos que nada revelam

De doce nem de fatal,

São joias frias que modelam

O ouro com o vil metal.

Quem te vê nesse andar que balança,

Manhosa de exaustão,

Imaginaria uma serpente que dança

Na ponta de um bastão.

(Ao andar teu corpo balança

Desfilando gozo e tesão,

Parece uma serpente que dança

Na ponta de um bastão.)

Sob o fardo da lascívia

Tua cabeça de infante

Ondeia com a malícia 
De um jovem elefante,
(Criança de lânguida beleza

Tua cabeça por um instante

Balança com a moleza

De um jovem elefante.)

 

E teu corpo se dobra e estira,
Como um barco sem mágoa,

Que costeia a margem e atira

Os seus ferros na água.

Como as vagas alimentadas pelas fontes

Dessas geleiras mordentes,

Quando as águas da tua boca são pontes

Rente ao fio dos teus dentes,


Creio beber da Boêmia um vinho,

Amargo e campeão,

Céu líquido que faz um caminho

De estrelas no meu coração!

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